Era uma vez um sujeito em pleno conflito da meia idade que decidiu aprender a sobreviver na natureza. Sabe uma dessas crises dos 40? Então, ela mesma. Obeso, sedentário e estressado, nosso anti-herói urbano partiu em busca de cursos sobre como se virar mato, como acampar, como obter água e comida, como navegar com mapas e bússolas – ou mesmo sem eles, guiando-se apenas pela geografia e pelas curvas de nível no terreno.
Eu fui esse sujeito. No processo de aprendizagem, perdi peso, melhorei meu condicionamento físico, ganhei confiança e algum tempo depois parti em uma expedição de duas semanas à pé pela Patagônia chilena com um grupo de sujeitos igualmente doidos. Ao longo dessas jornadas, nada provocou uma mudança interna tão grande quanto o hábito da Meditação. Tive a sorte de ser apresentado a ele por um casal de amigos em Gonçalves (MG).
Havia ido ao Refúgio Kalapalo para um módulo de trekking e navegação por GPS com o Guilherme Cavallari, um aventureiro e uma pessoa incrível. Dentre as aulas no Refúgio, Guilherme e sua esposa, Adriana, apresentaram a Meditação como um método para ampliar a capacidade de concentração e expandir os limites do corpo.
Em uma situação de risco, perdido no meio da floresta ou com o joelho torcido no alto de uma montanha gelada, manter sua mente calma e focada pode ser a diferença entre voltar para casa com uma boa história ou dentro de um saco plástico. Essa ferramenta se mostrou crucial na Patagônia, com seus ventos incansáveis, temperaturas abaixo de zero, dieta restrita e longas caminhadas por trilhas selvagens de tirar o fôlego carregando uma mochila de 20 kg.
Desde então, Meditar se tornou um hábito de verdade em diversas outras aventuras. Mais que isso: meditar me ajudou a alcançar mais harmonia, mais conforto, mais consistência, mais entendimento, mais atenção ao presente e apreço ao frugal, ao mesmo tempo em que diminuiu a preocupação com o desimportante.
Provavelmente, o brinde mais valioso da Meditação foi adquirir a capacidade de compreender minha própria mente. Antes, nunca havia me dado conta do que realmente acontecia dentro da minha cabeça. Eu seguia as ideias como um cão robótico correndo atrás de um gato de fumaça. Meditando, compreendi que comportar-se de modo automático é uma ESCOLHA. Suas ideias não são você: elas são algo que você POSSUI. Deixá-las no comando da sua vida é uma opção que você faz. Ou não faz.
Quando você medita, é possível enxergar com clareza essa flexibilidade, e a sensação de liberdade e independência é fantástica. Por isso eu recomendo fortemente: MEDITE! Pode não ser algo fácil, mas você pode começar aos poucos e ir se tornando melhor a cada dia. Não espere dominar essa arte num pulo: só a prática irá trazer o domínio. Não existe sorte aqui, apenas disciplina.
Para facilitar sua vida, preparei 15 dicas sobre como começar a meditar. Tente uma ou outra abordagem e volte a este texto até ver qual delas melhor se ajeita à sua rotina.
- SENTE-SE POR 2 MINUTOS. Isso parece ridículo, não? Sentar-se de olhos fechados, quieto e em silêncio por 2 minutos, uma vez por semana. Você pode ir aumentando 2 minutos a cada semana, e então passar a meditar duas ou três vezes na semana – ou mais -, até atingir um ponto satisfatório para você. Particularmente, considero 20 minutos diários o ideal.
- APROVEITE O HORÁRIO DA MANHÃ. Dizer “vou meditar 2 minutos todo dia” é tão fácil quanto deixar de meditar 2 minutos todo dia. Crie o hábito de reservar um horário específico para isso. Eu descobri um intervalo ótimo de manhã, bem cedo, depois de despachar as crianças para a escola e antes de ir para o trabalho. Algumas vezes, coloco o alarme uns 20 ou 30 minutos antes do previsto para ganhar este tempo extra.
- NÃO FIQUE SE PERGUNTANDO “COMO”. Muitas pessoas ficam preocupadas sobre onde se sentar, como se sentar, se tem uma almofada especial ou um tapete especial… esqueça isso. Sente-se em qualquer lugar ou mesmo no sofá da sala ou na sua cama, de pernas cruzadas ou não. Tanto faz, desde que você comece. Mais tarde, você pode otimizar sua posição e seu canto para meditação, mas no princípio isso não faz diferença. Apenas procure um lugar confortável e fique lá em silêncio.
- PERCEBA COMO VOCÊ ESTÁ SE SENTINDO. Assim que iniciar sua sessão de meditação, feche os olhos e confira como você está se sentindo. Quais sensações percorrem seu corpo? Como qualificaria o seu estado de espírito? Cansado? Ocupado? Ansioso? Não existe um sentimento correto: todos são corretos. O importante é que você o perceba.
- CONTE SUAS RESPIRAÇÕES. Agora que você está em silêncio, coloque sua atenção sobre os movimentos respiratórios. Existe algum ponto onde você sente esse fluxo com mais intensidade? Na ponta do nariz, no fundo da garganta? Respire o mais lentamente possível e perceba esse ponto à medida que o ar entra e sai das vias respiratórias. Tente contar UM quando inspira e DOIS quando expira. Repita a contagem até 10 e comece de novo.
- VOLTE QUANDO ESTIVER DIVAGANDO. Sua mente é como um macaco pulando agitado. Ele vai e volta por um emaranhado de ideias nem sempre conectadas entre si. Ele quer tirar sua atenção, quer que você o acompanhe perambulando por toda parte, fazendo macaquices. Não há qualquer demérito nisso.
Quando estiver meditando, assim que perceber que a mente começou a divagar e a distanciar você do estado de quietude, simplesmente deixe-a ir e retorne ao compasso da sua respiração. Retorne ao ponto onde você percebe o ar entrando e saindo de seus pulmões. Conte “um” novamente e comece tudo outra vez.
Pode ser frustrante no começo. Não desanime. O macaco continuará saltitando de um lado para o outro. Tudo que você tem que fazer é optar por não segui-lo. Deixe-o ir, como um filme sendo projetado numa tela, e permaneça em seu lugar, sentado, em silêncio e focado na respiração.
- DESENVOLVA A AMABILIDADE. Quando pensamentos e emoções surgirem durante a meditação, contemple-os com afeto. Eles não são o inimigo, mas um produto seu, como seus amigos, como seus filhos. São uma parte da sua vida, mas não a resumem. Não os espante: simplesmente observe-os à distância, com curiosidade e amabilidade. Respire.
- NÃO SE PREOCUPE COM AS FALHAS. Não se preocupe tanto se as coisas não correrem exatamente como você planejou nas primeiras vezes. Meditar é um exercício. É preciso prática e consistência para desenvolver os músculos de modo adequado. Não existe um modo “certo” para meditar. Simplesmente sinta-se bem e feliz por estar fazendo isso, enquanto procura o melhor método para você.
- NÃO TENTE ESVAZIAR SUA MENTE. Muitas pessoas acham que meditar tem a ver com esvaziar a mente, cessar todo e qualquer pensamento. Não é bem assim. Ainda que esse silêncio de ideias possa acontecer algumas vezes, este não é o objetivo da meditação. O cérebro é uma indústria de ideias assim como seu coração é uma fábrica de batimentos. Não é possível desligar qualquer um dos dois sem prejuízos óbvios.
Ao invés de se esforçar para esvaziar sua mente, apenas pratique sua atenção. Coloque o foco na respiração e deixe a mente se perder em devaneios. Não se irrite com as ideias, não as siga. Apenas mantenha-se firme em seu silêncio e pouco a pouco o macaco irá se cansar de pular nos galhos, intrigado com sua serenidade.
- FIQUE COM O QUE VIER. Quando os pensamentos e emoções surgirem – e eles irão surgir -, você pode tentar segui-los por um tempo. No começo, não recomendo isso. Contudo, com a prática – digamos, depois de umas três semanas meditando diariamente -, é possível deixar seu ponto de atenção e acompanhar o desenvolvimento de um pensamento ou emoção, como se estivesse acompanhando algum animal exótico durante um safári.
Nós tendemos a evitar sentimentos como frustração, raiva e ansiedade, mas a meditação ensinará você a seguir essas emoções, identificar de onde elas vêm e como elas se comportam. Você não precisa transformar-se nelas, mas pode divertir-se explorando e descobrindo seus hábitos. Essa curiosidade abrirá janelas sublimes dentro de você.
- CONHEÇA-SE. Ser capaz de manter um foco e eventualmente distanciar-se dele, investigando pensamentos e emoções e então retornando ao ponto de equilíbrio, permitirá que você decifre o modo de funcionamento de sua mente. O que se desenrola dentro de você? No lamaçal confuso de suas ideias, observando as divagações, as frustrações e toda sorte de sentimentos difíceis misturados, como você se comporta? Essa compreensão é um dos maiores prêmios da meditação. Conhecer sua mente é iluminar as profundezas mais misteriosas de quem você realmente é.
- SEJA SEU MELHOR AMIGO. Conhecer intimamente alguém pode estabelecer um princípio de aversão ou um vínculo incrível de amizade. Não se critique em demasia. Seja hospitaleiro: você está começando a conhecer um bom amigo. Seja simpático. Receba-o e trate-o bem. Afinal, você terá que suportá-lo até o fim dos seus dias.
- PERCEBA CADA PARTE DO SEU CORPO. Assim que estiver sendo capaz de acompanhar sua respiração, você pode começar a desviar o foco para uma parte do seu corpo de cada vez. Comece com a planta dos pés. Como você as sente? Frias? Aquecidas? Dormentes? Confortáveis? Lentamente, mova os dedos dos pés, seu tornozelo – um de cada vez -, os músculos da panturrilha e em torno dos joelhos, e suba dessa forma até o topo da cabeça.
- PERCEBA OS ELEMENTOS À SUA VOLTA. Outro modo de deslocar sua atenção consiste em perceber seu entorno. Novamente: isso só deve ser feito DEPOIS que você tiver alcançado o controle do foco na respiração. Mantendo a consciência da inspiração e expiração, abra lentamente os olhos. Fixe o olhar em um ponto e deixe a visão periférica perceber a luz à sua volta. No dia seguinte, mantenha os olhos fechados e perceba os sons do ambiente.
- SORRIA AO FINAL. Sempre que terminar seu ciclo de 2 minutos de meditação – ou mais -, sorria. Sinta-se grato por ter-se presenteado com este momento, orgulhe-se de sua disciplina, comemore o fato de ter feito contato com este novo grande amigo interno. Tenha certeza de que os minutos meditando foram um investimento incrível para sua vida. Sorria muito.
A Meditação nem sempre é fácil ou calma. Mas ela tem benefícios mais que documentados. É algo que você pode fazer em qualquer lugar – durante uma viagem, no seu escritório, no parque, na praia, quando está caminhando, nadando, remando, correndo.
Meditar sentado e de olhos fechados é a melhor maneira de fazer isso, mas com a prática você verá que possível expandi-la para vários outros cenários e contextos. Procure comprometer-se com a prática. Existem vários sites que oferecem meditações guiadas por meio de podcasts e arquivos mp3.
Eu já participei de grupos de meditação, mas prefiro meditar sozinho. Se isso ajudar você, que tal convidar sua esposa, seus filhos ou amigos? Ou participar de grupos, ou combinar com algum conhecido e trocar ideias com ele ou ela pelo Whatsapp todo dia de manhã, logo depois de vocês terem meditado?
O importante é tentar. Comece ainda hoje. E compartilhe sua experiência. Será um prazer ouvir o que você tem a dizer.