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A viagem de Pedro Álvares Cabral compete em nível de importância com a viagem de Cristóvão Colombo: sem desanimar pelas perdas sem precedentes, navegando contra tempestades, naufrágios e combates, Cabral cumpriu a missão que lhe foi sido atribuída ao ponto de se poder afirmar que poucas viagens para o Brasil e a Índia foram tão bem executadas como a dele. A expedição deu a Portugal a chance de estabelecer uma colônia na América do Sul, da qual a Civilização Brasileira surgiria.
Cabral também se deu bem com a empreitada: como recompensa por liderar a frota, recebeu o equivalente a aproximadamente 35 kg de ouro, além de várias vantagens comerciais e subsídios mensais polposos.
Na volta da expedição de “achamento” do Brasil, formaram-se facções na corte apoiando Cabral de um lado e Vasco da Gama do outro. Ainda mordido pelo ataque sofrido em Calecute, Cabral fez de tudo para planejar e ser nomeado para a Esquadra da Vingança, mas depois de oito meses de preparativos e desentendimentos com o rei foi substituído pelo navegador Vicente Sodré, tio materno de Vasco da Gama. Vicente faleceria em 1503, na costa de Omã, no naufrágio da caravela Esmeralda (cujos destroços seriam localizados apenas em 1998).
Ao ser preterido na missão de vendetta, Cabral demitiu-se (ou foi demitido) do cargo de capitão-mor e afastou-se (ou mais provavelmente foi afastado) da corte. Casou-se com Isabel de Castro em 1503, mesmo ano em que Gonçalo Coelho partiu para o Brasil em nova expedição exploradora e, como Gaspar de Lemos, também acompanhado de Vespúcio, o falsário.
Cabral e Isabel tiveram 6 filhos e retiraram-se para Santarém em 1509, onde o navegador passou seus últimos anos levando uma via pacata. Nunca mais voltaria ao mar. Faleceu em 1520, aos 53 anos, e foi sepultado em um túmulo provisório no interior de uma capela na cidade. E aqui reside um mistério:
Quando Isabel faleceu em 1538, o corpo do marinheiro foi exumado e a família Cabral ganhou um jazido definitivo na Igreja da Nossa Senhora da Graça. Todavia, na lápide estavam anotados apenas os méritos de Isabel de Castro e nem uma única palavra sobre as proezas de Pedro Álvares Cabral – uma prova da obscuridade a que Cabral foi submetido nos últimos anos de vida. Este túmulo permaneceu no esquecimento até 1839, quando foi redescoberto pelo historiador brasileiro Francisco Adolfo de Varnhagen. O estado de miséria do local quase provocou uma crise diplomática entre Dom Pedro II e D. Maria II – irmã mais velha de Pedro II e então rainha de Portugal.
Em uma investigação conduzida em 1882, na tentativa de se confirmar a presença do marinheiro na tumba, foram identificadas duas ossadas masculinas e uma feminina (provavelmente, o terceiro esqueleto pertencia a um dos filhos do casal que morreu pouco depois do pai), além do esqueleto de uma cabra.
Em 1903, o jazigo da Igreja da Graça foi reaberto por investigadores brasileiros. Desta vez, encontraram ali dentro os restos de 8 corpos: cinco ossadas masculinas, uma feminina e duas de crianças. Não foram relatadas mais cabras.
Apesar de não ter sido oficialmente autorizada qualquer translação, os pesquisadores usaram os ossos para formar dois esqueletos completos, deixando 1 em Portugal e trazendo outro para o Brasil, que foi depositado na Igreja do Carmo, a antiga Catedral Metropolitana do Rio de Janeiro – mas só Deus sabe exatamente quem está enterrado aonde nessa mistura toda.
Em Portugal, Cabral sempre foi – e continua sendo tido como – um explorador de segunda categoria devido à vasta sombra da fama de Vasco da Gama. Sem embargo, devemos a Cabral o plantio derradeiro em nossa terra da semente que viria a ser o Brasil, onde quer que seus ossos estejam.